Apresentações para valorização da cultura negra agitam Parque Sara Areal

DANILO-SERGIO

A cidade de Nilópolis recebeu, entre 20 e 26 de maio, o Festival Caminhos da Negritude – Edição BXD, no Parque Municipal Professora Sara Areal. O evento reuniu mais de 50 atrações durante sete dias com o objetivo de construir diálogos sobre a história e a herança africana na Baixada Fluminense, fortalecer estratégias e contribuir para políticas de combate ao racismo.
Desde a escolha do nome à uma grandiosa programação que uniu diferentes campos de saberes, o festival obteve êxito e fez história na Baixada, como repetido por muitos dos presentes, ao criar um movimento potente, articulado e com enfoque na pauta racial, fora do mês de novembro (quando geralmente se concentram ações sobre a cultura negra), em um território que ainda é marginalizado, com o propósito de valorizar a história negra da sua região e de gerar protagonismo para sua população.
De acordo com os dados do Censo 2022, divulgados pelo Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), cerca de 69% da população da Baixada Fluminense se declara como preta ou parda.
O professor Nielson Bezerra, primeiro palestrante do festival, apresentou importantes aspectos historiográficos sobre a formação da Baixada Fluminense. Em sua fala, o professor destacou como, no processo de busca, pensamos na África como um lugar tão distante, sendo que ela está em nossas raízes e em nossos fazeres. “O festival é como um novo quintal que vem sur-gindo para que a cultura possa ampliar os limites da juventude, das crianças e dos adultos desta região, que foi formada por sambaquieiros, indígenas tupinambás e africanos de povos Bantus”, compartilhou.
Mas as palestras não abordaram só o passado, nomes como Lu Ain-Zaila, Leandro Santanna, Cleide Mello, Iolly Amancio, Debora Bonfim, Elaine Rosa, Moisés Machado e babalawo Ivanir dos Santos contribuíram com grandes reflexões sobre o hoje e o amanhã nas salas de aula, no mercado de trabalho, na autoestima, ao cultivar a espiritualidade, nas artes, no empreendedorismo e, principalmente, no desenvolvimento e fortalecimento individual e coletivo frente às violências cotidianas e contínuas do racismo.
Debora Bonfim, moradora da cidade e psicóloga, por exemplo, ressaltou a diversidade da beleza negra, as ações e iniciativas que podem ser geradas para impactar positivamente na autoestima de mulheres negras e na valorização da pluralidade de corpos. A psicóloga encerrou sua apresentação com a reali- zação de um desfile.
Outro desfile ocorrido na programação foi da marca Ya Massemba. De acordo com seu fundador, Luiz Américo Henriques, a participação no festival teve como intuito mostrar que “gente preta faz arte, é referência, tem e deve ter o seu lugar respeitado”.
O empreendedorismo também ganhou espaço no festival, dentro da feira criativa, mostrando a diversidade de técnicas, produtos e talentos artísticos desenvolvidos a partir de pesquisas e referências negras. Os empreendimentos participantes do evento foram: Arte no Vinil Onilio e Celia, Black New, Arteira Amigurumis e Crochê, Arte Crespa, Donna K, Ateliê dos Doces, Simplesmente Taty, Nessa Arte e Biju e Birdland Rose Style e Ya Massemba .
Sob o comando da apresentadora, Milse Ramalho, o festival foi aberto com a Lxmcompany, com um espetáculo autoral, criado após um caso de racismo sofrido pela diretora da companhia.
A programação artística da semana recebeu, ainda, performances de teatro, com Karla Muniz, que emocionou o público com a história de “Vanessa”; de dança, em um mergulho no universo feminino e nos itans (relatos míticos da cultura iorubá) de Oxum, orixá das águas doces, com a Resistência Bellyblack, e em um percurso histórico do negro no Brasil, com o Estúdio Art’Dance; e de muita música, com Condoreiro, Vino Cachorrão e Medusza.
No final de semana, a música protagonizou a programação, com grandes shows de Walle B, Crioula, Os Dofonos, Paula Black, Laizz e Capelloni.
A parte formativa não ficou de fora, recebendo os oficineiros Andressa Cristina, Jéssica Sodré, Larissa Morais, Rafael Côbo, Pamella Almeida, Misael Gonçalo, Angela Nascimento, Claudia PinhoRafaelle Vieira, Glaucia Augusto, Vagner Santos e Bruno Alarcon, que ministraram atividades de artesanato, teatro, design, marketing digital e dança e fizeram muito sucesso com o público.
O Dia da África, 25 de maio, data trouxe a nomeação da madrinha do festival: a porta-bandeira da escola de samba Beija-Flor de Nilópolis, Selminha Sorriso. Em seu discurso, a artista reforçou a importância do festival, e, muito emocionada, compartilhou com o público o seu processo de se reconhecer uma mulher negra.
A madrinha do festival, além de ser uma figura conhecida pela população da região e ligada a um dos espaços de exaltação das culturas africanas e afro-brasileiras: a escola de samba, é também a voz que carrega a herança das lideranças ancestrais e assume o compromisso junto com o festival de escrever uma nova história para e com as próximas gerações.
Vinni Rodrigues, um dos idealizadores do festival destaca:
— Foi a realização de um sonho profissional, no mês de aniversário da Vinni Produtora Cultural, com muita luta, resistência, persistência e muitas parcerias. Um festival que nos ensina que há sim caminhos para sabermos convivermos uns com os outros, e que o protagonismo negro, a nossa negritude, a nossa ancestralidade nunca mais poderá ser apagada, e sim rea-firmada dia-a-dia na nossa sociedade. O Caminhos da Negritude veio pra ficar, pra fazer história e para construir esse legado para a cultura nilopolitana e para toda a Baixada Fluminense.
Segundo moradores, o festival também trouxe uma importante contribuição para o território ao ocupar o Parque Municipal Professora Sara Areal. O parquinho, como é conhecido, é uma das praças mais antigas da cidade. Foi recém-reformado, após anos de abandono, e os moradores estão conhecendo ou vol- tando a frequentar o local.
O projeto é uma produção da Vinni Produtora Cultural, com realização do Governo Federal, Ministério da Cultura, Governo do Estado do Rio de Janeiro, Secretaria de Cultura e Economia Criativa do Rio de Janeiro e Lei Paulo Gustavo. E contou com uma equipe experiente e diversa, em sua maioria formada por moradores da Baixada Fluminense e grande apoio da equipe do Parque Municipal Professora Sara Areal.

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